quarta-feira, 7 de julho de 2010

O Passarinheiro

Já era senhor e a idade não dava trégua, desde quando era garoto ele sentia-se cansado de ser velho. Vivia enfurnado com seus artefatos e pássaros, seus troféus, em um quarto solitário nos fundos da casa de sua filha.
Fazia tempo que o velho só fazia isso, talvez tenha sido a única coisa que ele tenha gostado de fazer em toda sua vida, mas desde que se aposentou, e parou de trabalhar naquela serralheria, ele passou a desenvolver mais e mais armadilhas e construir mais e mais gaiolas. Era notavel a felicidade dele quando capturava um passarinho novo, mesmo que fosse apenas um pardal.
Ninguém que ele conhecia jamais o compreendeu por ser tão fanático por pássaros. Talvez não entendessem que na verdade ele gostava era da privação da liberdade dos outros. Mas como ele jamais foi corajoso suficiente para aprisionar um ser maior que poucos centimentros, acabou se tornando um ditador de passarinhos.
Imperador Passarinheiro gostava de impor comando, gostava de privações, mas jamais machucou um pássaro.
Um dia ele morreu, demorou um tempo para notarem sua ausência já que sua filha passou uns dias fora em uma viagem de negócios. Os pássaros morreram de fome sem seu líder solitário, lamentaram a morte do governante estranho e deixaram de existir com ele, assim, quase pra sempre.

quinta-feira, 1 de julho de 2010

Pela Merda do Dinheiro

Esse não é bem o tipo de trabalho que gosto de fazer, mas é como sempre digo, nenhum trabalho pode ser tratado com desdém ou como secundário. Meu pai sempre me disse que se eu me propus a fazer algo, devo fazer da melhor maneira possível.
Odeio esse cigarro também, mas não tinha outro naquela loja barata que passei. Aceito essa bela e densa fumaça em meus pulmões como terapia, afinal não é qualquer dia que se faz algo do tipo.
Entro no prédio olhando a foto deles, uma bela família. Digo um nome, mostro uma identificação e vou para o elevador sem que ninguém obstrua minha passagem. Realmente estou horrível com esse uniforme, ele fede a rato morto.
Limpo impecavelmente a janela, enquanto aguardo todos entrarem na sala. Realmente uma família invejável. Um homem exemplar, uma mulher linda, duas filhas doces. Nessa hora eu lembro que odeio prédios altos.
Em alguns segundos esse andar vai pelos ares, na verdade 50 segundos, e eu preciso descer 20 andares de escada. Eu adoro portas de incêndio. É realmente uma pena, não gosto de matar pessoas felizes.
Depois de descer quase 10 andares, o barulho ensurdecedor do sucesso chega aos meus ouvidos. O prédio é evacuado em poucos minutos.
Eu estou longe, bem longe de onde jamais estive. Já não estou mais com aquele uniforme ridículo, mas continuo respirando fundo.
Essa vida de mentiras só pode ser recompensada com muito dinheiro. E é só por isso que vendo minha alma todos os dias, pela merda do dinheiro.